segunda-feira, 25 de fevereiro de 2008

PÁGINA DO DIÁRIO DE UMA EXPATRIADA

Segunda-feira, 18 de Fevereiro de 2008


Querido diário:

Por causa da minha constipação, alergia, ou o quer que seja, acordei muito cedo, quase de madrugada. Para não variar, me embalar e tentar redormir liguei o meu pequeno leitor de mp3, que por acaso também tem rádio, e pus-me a ouvir as notícias. Não sei porque carga de água, mas adormeço mais depressa com as palavras do que com a música. Defeito de construção!... Eis senão, quando ao bater das seis na Antena 1, descobri que eu, nascida no distrito e concelho do Porto, residente em Matosinhos, província do Douro Litoral, situada no Noroeste de um país chamado Portugal, estava sob um forte temporal de chuva e vento. Pus a cabeça fora dos cobertores, tirei o auricular do ouvido e não ouvi r i g o r o s a m e n t e ruído algum salvo um leve respirar constipado do companheiro do lado. Voltei a por o auricular e a meter a cabeça no sítio do costume. E o locutor continuava a debitar os horrores do temporal que se abatera sobre TODO o país. Mas que país? Aquele que se chama Portugal e onde eu julgava que estava? Duvidava. E até às sete de manhã eu fui ouvindo notícias e não ouvindo temporal nenhum. C’os diabos! Eu não deveria estar em casa porque a minha casa é em Portugal. Comecei a ficar na dúvida se estaria lá realmente ou se por qualquer acaso teria havido também uma inesperada declaração unilateral da independência do Norte, no seguimento da de ontem do Kosovo, e eu não havia dado conta. Será que Isso poderia ser uma explicação para o facto de eu não ter temporal? Mas outro problema se me levantou: se deixara de pertencer a Portugal qual era então o meu país? Não sabia e… concluí que deveria ter sido expatriada. Às sete horas ouvi, na mesma estação radiofónica e estatal, que os portos de todo o país tinham sido fechados: Olhão, Tavira, Sines, ficando Setúbal e Portimão, com circulação sob controlo. Recordei o mapa de Portugal e percebi que todos eles se encontravam a sul de Lisboa o que veio confirmar a minha expatriação porque se o sítio onde vivia fosse Portugal ao referirem “todos os portos” teriam de citar também Aveiro, Porto e Viana. E sobre estes o silêncio era absoluto. Voltei a perguntar-me a quem pertencia então e acabei na conclusão inicial: só podia ter sido expatriada. E eu que gosto tanto de Portugal fiquei com pena porque além de apátrida deixara de ser portuguesa. Pelas sete e meia felizmente surgiu a resposta para o meu problema pela voz de uma pessoa que parecia saber o que estava a dizer pois era um meteorologista do INM (Instituto Nacional de Meteorologia). Segundo ele a situação dramática que se vivia abarcava o Centro e Sul do país e não todo o país. Aí os locutores da Antena 1 mudaram a cassette e finalmente, no noticiário das oito, a verdade foi reposta. Então, depois de me perguntar se saber como estava o tempo no Norte através dos correspondentes da media e imprensa locais, da Internet, dos telefones e dos telemóveis teria sido algo intransponível para os redactores das notícias até então despejadas, pude readormecer em paz pois afinal não perdera o meu país.

Até amanhã, querido diário

Caros leitores. Desculpem-me o tom de ligeireza deste texto. Mas é que há coisas que me põem doida. A gente já sabe há muito que Lisboa é Portugal e o resto é … Mas esta mania que os autores dos noticiários emitidos da capital têm de generalizar para todo o país o tempo que faz em Lisboa, demonstra o modo fácil e leve com que compõem as notícias. O que aconteceu no dia 18 foi um exemplo evidente dessa falta de cuidado. O que me parece é que, quase diariamente, não tendo ainda os dados do INM, aqueles senhores de Lisboa se esclarecem sobre as condições atmosféricas abrindo uma janela e pondo a mão de fora para ver a temperatura e olhando para o céu a ver se chove. E depois … é só dizer como está o tempo em TODO o país. Sim, porque se houver dilúvio em Freixo de Espada à Cinta, é mesmo só lá e não em TODO o país.


(texto semanal para o Matosinhos de Hoje a publicar em 27.2)

5 Comentários:

Às 25 de fevereiro de 2008 às 21:23 , Anonymous Anónimo disse...

Muito bem observado...
Mas eu acho que estes casos nem são bem uma questão de discriminação ou não ligar ao resto do país... é mesmo incompetência pura e dura!!!
Parabéns pelo texto!
gaivota do sul

 
Às 25 de fevereiro de 2008 às 22:29 , Anonymous Anónimo disse...

BOLAS!Estás mal aproveitada.E eu a julgar que escrevia alguma coisa!


G.MIMI

 
Às 26 de fevereiro de 2008 às 11:58 , Anonymous Anónimo disse...

Embora "uma andorinha não faça a Primavera" (é assim, pois é?), esta é uma boa análise, quase 'académica', do funcionamento de alguma - muita - Comunicação Social. Mas não só aqui.
Posso garantir que não se trata de qualquer discriminação geográfica. É mesmo preguiça, maus hábitos, incompetência.
(Que os há em todas as áreas. Só que não são tão visíveis...)

Paula

 
Às 26 de fevereiro de 2008 às 12:02 , Blogger Gaivota Maria disse...

Realmente, Gaivota do Sul, os nossos redactores são de uma incpmpetência alucinante. E o pior é que continuam a insistir na asneira ao longo da semana. E os erros de português que eles dão? Que Deus nos proteja...
Quanto a ti Mimi, um elogio desses vindo daí tem o valor de um Óscar.
Será que os vários desafios que, não sei há quantos anos, me tens andado a fazer não estarão na base deste resultado?
Um abanar de asas para as duas

 
Às 26 de fevereiro de 2008 às 12:09 , Blogger Gaivota Maria disse...

Paulinha, minha filha-mãe,que bom ver-te por aqui! É mais uma gaivota que entra no nosso bando e és muito bem recebida. Claro que as minhas palavras não atingem toda a Comunicação Social, mas sabes melhor do que eu que há gente por ali que deveria mudar de vida.E há outra que continua a não ter o lugar que merece. Um beijo para ti
PS Foste hoje ao nosso blog? Alguém acordou

 

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